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A pesca de baixo impacto é um caminho e não um fim

Artigo de opinião de Ana Henriques, Técnica de Oceanos e Pescas da ANP|WWF

Todas as atividades humanas que extraem recursos naturais têm impacto. O mesmo acontece com a pesca, que impacta ecossistemas marinhos, biodiversidade, as nossas emissões totais de carbono, meios de subsistência das comunidades costeiras ou a qualidade do pescado que acaba por ser servido nos nossos pratos.

Quase a atingirmos a viragem de ¼ deste século XXI, é já por demais claro que devemos reconciliar urgentemente a nossa relação danificada com a natureza. Isso inclui repensar a forma como pescamos. Mas esta responsabilidade não está apenas nas mãos dos pescadores: a UE e os seus Estados-Membros têm um papel crucial a desempenhar para facilitar e incentivar uma transição para pescarias de baixo impacto, em conformidade com os objectivos da UE em matéria de pescas e ambiente.

Apesar de esforços e algumas melhorias, a gestão das pescas permanece demasiadas vezes ancorada numa abordagem produtivista, o famoso MSY (sigla em inglês para máximo rendimento sustentável), e não reflete a abordagem precaucionária e de gestão de pescas ao nível do ecossistema

Técnicas de pesca seletiva

A necessidade de minimizar o impacto das atividades de pesca está bem presente na atual Política Comum de Pescas (PCP) da União Europeia (UE) e até noutras políticas marinhas como a Estratégia de Biodiversidade da UE, a Agenda 2030 da ONU e os compromissos da COP15, para citar alguns. A PCP define a pesca de baixo impacto como “um tipo de pesca que utiliza técnicas de pesca seletiva com um impacto reduzido nos ecossistemas marinhos ou que dão origem a baixas emissões de combustível, ou ambas”. Além disso, incentiva a atribuição de benefícios a pescarias que reúnam certas condições e comprovem que são de baixo impacto através de critérios e indicadores bem definidos. No entanto, 10 anos após a última reforma da PCP, a transição necessária para pescas da UE de baixo impacto ainda está longe de ser alcançada, como indica o relatório de 2023 da Comissão Europeia sobre a implementação da PCP e o seu plano de ação para proteger e restaurar ecossistemas marinhos para pescas sustentáveis e resilientes.

Apesar de esforços e algumas melhorias, a gestão das pescas permanece demasiadas vezes ancorada numa abordagem produtivista, o famoso MSY (sigla em inglês para máximo rendimento sustentável), e não reflete a abordagem precaucionária e de gestão de pescas ao nível do ecossistema, que também é um dos objectivos da PCP, ignorando assim o papel preponderante da pesca na qualidade dos ecossistemas marinhos, do qual todos dependemos, ou mesmo na dimensão social, basilar para a sobrevivência humana.

Para concretizar e operacionalizar o objetivo da UE de ter uma pesca sustentável e de baixo impacto, pescadores, cientistas, autoridades governamentais e sociedade civil devem unir forças para encontrar mecanismos para avaliar os impactos de cada pescaria com base no melhor conhecimento disponível, identificar e abordar as suas deficiências, incentivar e medir o progresso para tornar as práticas e técnicas mais sustentáveis e, uma vez feito esse caminho, repetir o processo novamente, porque a pesca de baixo impacto é um caminho, e não um fim.

Para suportar esta visão, a ANP|WWF e o escritório de políticas europeias WWF-EPO desenvolveram uma metodologia – a “Ferramenta Pescas de Baixo Impacto – e uma publicação Da teoria à prática: navegar para pescas de baixo impacto na UE – para ajudar a aprofundar melhor o conceito de pesca de baixo impacto, exemplificar a potencialidade da utilização de critérios e indicadores para avaliar o impacto atual de uma determinada pescaria da UE no contexto da PCP, e para servir de apoio à decisão. Esta ferramenta foi testada em duas pescarias portuguesas que estão a progredir para uma pesca de baixo impacto através de processos de cogestão.

A transição na União Europeia para pescarias de baixo impacto – aquelas que são ambientalmente sustentáveis, economicamente viáveis e socialmente responsáveis –, embora necessária, não acontecerá de um dia para o outro. Saber por onde começar é o primeiro passo para o progresso. A avaliação das pescarias utilizando ferramentas como a desenvolvida nesta publicação ajuda-nos a identificar e a dar prioridade às medidas e acções que melhor podem contribuir para minimizar os impactos negativos de uma pescaria e medir os seus progressos ao longo do tempo.No contexto da dupla crise climática e da biodiversidade, os mares da UE, e os meios de subsistência que deles dependem, o tempo de mudar é mesmo agora.

Agricultura e Mar

 
       
   
 

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