Artigo de opinião de Bianca Mattos, Coordenadora de Políticas da ANP|WWF
No dia 31 de janeiro de 2025, a Assembleia da República deu um passo decisivo ao aprovar na generalidade uma moratória à mineração em mar profundo em águas nacionais até 2050. Esta decisão, fruto de anos de trabalho da sociedade civil, cientistas e (alguns) decisores políticos, alinha Portugal com a melhor evidência científica disponível e com o princípio da precaução que deveria guiar todas as políticas ambientais.
A mineração em mar profundo visa extrair minérios como cobre, cobalto, níquel e manganês – matérias-primas consideradas essenciais para diversas indústrias estratégicas ligadas à energia e às tecnologias – das profundezas dos oceanos, recorrendo à maquinaria pesada em ambientes de elevada pressão, num cenário em que o conhecimento científico disponível é mesmo muito reduzido. Esta atividade acarreta riscos ambientais imensuráveis, desde a destruição de habitats únicos à extinção de espécies desconhecidas, sem esquecer os impactos na pesca e na saúde dos oceanos – logo, na nossa própria saúde e sobrevivência.
O posicionamento do Parlamento não poderia ser mais bem-vindo. No cenário internacional, a Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos (ISA) continua a discutir a implementação de um “código mineiro” para permitir a exploração dos oceanos em larga escala. A pressão económica para avançar com esta atividade ignora os alertas da comunidade científica, que reconhece a mineração em mar profundo como uma ameaça séria à biodiversidade e à estabilidade climática global.
A importância desta moratória não se resume à proteção das águas nacionais. Em 2022, na Conferência dos Oceanos da ONU, Fiji, Palau e Samoa anunciaram a criação de uma aliança para uma moratória à mineração em águas internacionais. Portugal, que já tinha anunciado em 2023 junto do Conselho da Autoridade Internacional dos Fundos Marinhos que defendia a implementação de uma “pausa precaucionária” no avanço desta atividade em águas internacionais, pode e deve reforçar este compromisso, liderando um esforço diplomático contra esta indústria emergente para garantir a proteção do mar profundo.
Apesar deste avanço legislativo, o trabalho está longe de terminado. O histórico recente demonstra que processos legislativos podem ser revertidos com mudanças políticas. O projeto de lei que agora avança já tinha sido aprovado na legislatura anterior, mas perdeu o seu efeito com a queda do Governo no final de 2023. Para evitar novos retrocessos, é essencial que os trabalhos na especialidade decorram com celeridade e que a sociedade civil se mantenha vigilante e participativa – sim, queremos continuar a ser ouvidas e garantir a nossa participação é um dever dos decisores políticos.
A transição energética, frequentemente apontada como a grande necessidade e razão para o avanço desta nova indústria, não pode ser feita à custa da destruição de ecossistemas essenciais. Precisamos de soluções verdadeiramente sustentáveis, que respeitem os limites do planeta e protejam os serviços ambientais dos quais dependemos.
Portugal tem agora a oportunidade de dar o exemplo, e de uma vez por todas. O caminho para um oceano protegido exige compromisso contínuo e ação política firme. O mar profundo não pode ser a próxima vítima da exploração descontrolada. Está nas nossas mãos garantir que a sua riqueza seja preservada e continue intocável para bem do futuro de todos.
Agricultura e Mar