Artigo de opinião do site A Cientista Agrícola
Autora do artigo: Mafalda Reis Pereira, Engenheira Agrónoma
O que é o Green Care?
O termo Green Care envolve uma grande complexidade de actividades que utilizam a natureza e o meio ambiente como um processo activo para promover e/ou aumentar a saúde (física e mental) e o bem-estar dos seus praticantes, assim como, para promover benefícios educacionais e sociais.
Por este motivo, nem todas as formas de contacto com a natureza podem ser englobadas neste termo (Haubenhofer, D. et al. 2013). Das actividades que integram o conceito, destaca-se a prática de agricultura / jardinagem, a terapia assistida por animais, a horticultura terapêutica, entre outros (Hassink & Van Dijk, 2006).
O Green Care é uma prática extremamente complexa, que envolve diferentes dimensões e elementos relacionados com as necessidades dos diferentes grupos de trabalho.
Destina-se a qualquer praticante interessado nesta temática mas pode ser especialmente útil para pacientes psiquiátricos, pessoas com deficiência mental, pessoas com dificuldade na aprendizagem, pessoas com problemas de burnout, pessoas com problemas de consumo abusivo de substâncias, entre outros. É ainda interessante para pessoas idosas e crianças ou jovens, inserindo-se estes últimos grupos numa vertente mais ligada à integração social e educação.
Autor da imagem: Bonnie Kittle, Unsplash
Exemplos de práticas que integram o Green Care
“Care farming”
Consiste na utilização de explorações ou paisagens agrícolas convencionais como base para a promoção da saúde física e mental e de benefícios sociais e educacionais através da execução de tarefas rotineiras da exploração. Trata-se de uma parceria entre os agricultores, participantes e provedores de cuidados terapêuticos e sociais.
Autor da imagem: Anaya Katlego, Unsplash
“Healing Environments” e “Healing Gardens”
Espaços e jardins terapêuticos que possuem uma selecção e distribuição espacial cuidada dos seus elementos constituintes, para que possam ser utilizados como promotores de saúde física e mental e de interacções sociais entre as pessoas presentes em instituições de cuidados de saúde (por exemplo, hospitais, casas de repouso, lares, etc…).
Estes espaços são especificamente concebidos para serem utilizados em processos de recuperação de doenças ou ferimentos ao atenuar sintomas físicos, diminuir o stress e aumentar o bem-estar do paciente.
São espaços esteticamente atractivos que podem conter flores, arbustos e árvores, lagos e fontes e sítios para sentar e relaxar. Os seus utilizadores são encorajados a olhar em volta, a interagir com a natureza, fazendo-o quer sozinhos quer em grupos.
Aqui actividades mais activas, como passear e explorar, e actividades mais passivas, tais como observar, escutar e sentar são possíveis de ser executadas.
Autor da imagem: Thor Alvis, Unsplash
Estes espaços são geralmente utilizados por pessoas que estejam institucionalizadas em estabelecimentos de saúde (especial destaque para os hospitais de saúde mental), em lares de idosos e instituições para crianças. Existem jardins específicos para serem utilizados por pessoas com Alzheimer, de forma a estimular o sistema sensorial e a promover memórias e emoções positivas (Mourão, M.I. & Brito, L. 2015).
Os visitantes e mesmo os próprios profissionais que trabalhem nestas instalações podem usufruir destes espaços para relaxarem e fazerem uma pausa de um momento ou dia stressante.
Os efeitos positivos deste tipo de experiências com a natureza incluem a redução do stress, melhorias de humor e aumento da satisfação com os cuidados de saúde. Os ambientes (paisagens) terapêuticos têm alguns elementos em comum com os jardins de terapia: ambos têm uma função primordial de promover a saúde e actividade recreacionais, não incluem programas de terapia específicos e consistem em observar e interagir com a natureza envolvente.
No entanto, ao contrário dos jardins, estes espaços podem não estar localizados geograficamente e estruturalmente a instituições de saúde.
Autor da imagem: Nagesh Badu, Unsplash
Terapia Assistida por Equinos
Os métodos de terapia que envolvem cavalos são importantes para o desenvolvimento emocional, social e comportamental mais saudável em crianças e adolescentes.
Embora às vezes considerado um subgrupo da terapia assistida por animais de quinta, a percepção de cavalos como animais de companhia apoia a sua inclusão numa categoria separada.
Dentro deste subgrupo de intervenções do Green Care, existem quatro métodos diferentes que podem ser implementados por equipas terapêuticas:
(1) psicoterapia assistida por equinos (EAP);
(2) aprendizagem assistida por equinos (EAL);
(3) psicoterapia facilitada por equinos (EFP);
(4) aprendizagem facilitada por equinos (EFL).
Todos os quatro métodos utilizam cavalos como co-terapeutas de maneiras diferentes e com objectivos diferentes para os seus protocolos terapêuticos específicos. (Lee et al, 2016).
Autor da imagem: Ibrahim Rifath, Unsplash
Intervenções Assistidas por Animais de Quinta
As intervenções que envolvem animais de quintas são frequentemente combinadas com a prática de agricultura. Estas terapias promovem a interacção e o cuidado de animais, a fim de promover o bem-estar de pessoas com problemas mentais, físicos ou educacionais. As terapias que envolvem a interacção e o cuidado com animais demonstraram melhorar a depressão e a ansiedade, a auto-eficácia e outros aspectos da saúde em adultos e crianças (Mallon, 1994; Pedersen, Martinsen, Berget e Braastad, 2012, Pedersen, Nordaunet, Martinsen, Berget e Braastad, 2011; Scholl et al., 2008). Os principais objectivos destas interacções passam por promover certas necessidades terapêuticas, educacionais, motivacionais ou até sociais (Haubenhofer et al., 2010).
Autor do artigo: Agence Producteurs Locaux Damien Kühn, Unsplash
Horticultura Terapêutica
A horticultura terapêutica, ou terapia hortícola, utiliza plantas como uma ferramenta para ajudar os pacientes a recuperar ou aprender habilidades importantes para o seu ‘funcionamento’ normal.
Este tipo de actividades podem ser pensadas em termos de terapias cognitivas ou ocupacionais, devido aos seus objectivos de melhorar a memória, equilíbrio e coordenação, atenção e resolução de problemas.
A redução do stress, o relaxamento e o ambiente não ameaçador da interacção com a vida da planta, combinados com os benefícios físicos e mentais desse tipo de terapia, são os motivos pelos quais ela foi implementada com sucesso (Haubenhofer et al., 2010).
Horticultura social e terapêutica (HST)
Subgrupo da terapia referida anteriormente, é metodologicamente muito diferente da terapia não social.
Este ramo da terapia hortícola dá maior ênfase ao aumento geral no bem-estar de um indivíduo, em vez de ter objectivos específicos de melhorar os processos cognitivos ou físicos do praticante.
A horticultura social e terapêutica tem uma vasta presença no Reino Unido, sendo que 90% dos indivíduos que utilizam esta terapia têm problemas de saúde mental ou dificuldades de aprendizagem (Haubenhofer et al., 2010).
Fonte da imagem: Ecoterapeuta
Benefícios do Green Care
A prática do Green Care permite envolver os seus praticantes em actividades, com interesse produtivo e social, num ambiente livre de stress. Os praticantes aprendem ao longo de todas as sessões e vão desenvolvendo a sua capacidade de liderança e cooperação, praticam maior actividade física, sentem uma maior dignidade por efectuarem um trabalho produtivo, apresentam melhorias sociais e efeitos positivos na sua saúde mental (Steigen et al. 2015).
No caso da saúde mental, muitos aspectos positivos são decorrentes da prática destas actividades dos quais se destacam: maior bem-estar mental, uma atitude mais positiva, auto-aceitação e maior introspecção.
Em vários estudos foi registada uma diminuição dos sintomas de depressão e ansiedade (melhoria na saúde mental), salientando-se os efeitos positivos proporcionados pelo diálogo com o coordenador das actividades. Na maior parte dos estudos, os níveis de stress diminuíram durante a prática das actividades do Green Care (Gonzalez et al., 2009, 2010, 2011a, 2011b; Pedersen, Martinsen, et al., 2012).
Autor do artigo: Mark Tegethoff, Unsplash
Muitos participantes declaram sentir benefícios na execução destas actividades ao observarem o resultado dos seus esforços, o que os faz sentirem-se mais úteis. A capacidade de produzirem bens materiais (por exemplo, produtos hortícolas ou frutícolas que podem ser utilizados para auto-consumo ou para venda) contribui para de sentirem mais dignos, uma vez que se sentem mais contributivos, menos passivos e se sentem capazes de cumprir tarefas com rigor (Granerud et al., 2012; Pedersen, Ihlebæk, et al., 2012).
Em termos de ganhos sociais, conhecer pessoas na mesma situação ou que atravessam desafios e experiências semelhantes na sua vida é considerado positivo para muitos participantes. Muitos consideram ainda positivo o facto de poderem partilhar as suas experiências, o que faz sentir que são mais aceites e integrados pela sociedade (sentem-se menos intimidados e julgados). A partilha de refeições, o planeamento de actividades e as rotinas diárias são também factores importantes para o progresso e a dinâmica do grupo de participantes. O trabalho de equipa para além de instrutivo, desenvolve a capacidade de solidariedade e auto-eficácia (Steigen et al. 2015).
Muitos praticantes do Green Care referem que é extremamente agradável o contacto com a natureza, especialmente se este for feito ao ar livre. A maior percepção das diferentes estações do ano, das variadas condições climatéricas, a observação do crescimento e colheita de plantas e o contacto com animais são algumas das experiências que transmitem serenidade e paz interior aos praticantes.
O contacto com a natureza e com os animais são valorizados pois os praticantes não sentem julgamentos e exigências quando com eles interagem e, por outro lado, sentem que existe uma relação de confiança e de dependência dos seus cuidados (Pedersen, Ihlebæk, et al., 2012).
Referências bibliográficas
Anne Mari Steigen, Ragnfrid Kogstad & Jan Kåre Hummelvoll (2015). Green Care services in the Nordic countries: an integrative literature review, European Journal of Social Work, DOI: 10.1080/13691457.2015.1082983
Gonzalez, M. T., Hartig, T., Patil, G. G., Martinsen, E. W., & Kirkevold, M. (2009). Therapeutic horticulture in clinical depression: A prospective study. Research and Theory for Nursing Practice: An International Journal, 23, 312–328.
Gonzalez, M. T., Hartig, T., Patil, G. G., Martinsen, E. W., & Kirkevold, M. (2010). Therapeutic horticulture in clinical depression: A prospective study of active components. Journal of Advanced Nursing, 66, 2002–2013.
Gonzalez, M. T., Hartig, T., Patil, G. G., Martinsen, E. W., & Kirkevold, M. (2011a). A prospective study of existential issues in therapeutic horticulture for clinical depression. Issues in Mental Health Nursing, 32, 73–81.
Gonzalez, M. T., Hartig, T., Patil, G. G., Martinsen, E. W., & Kirkevold, M. (2011b). A prospective study of group cohesiveness in therapeutic horticulture for clinical depression. International Journal of Mental Health Nursing, 20, 119–129
Granerud, A., Eriksson, B., & Lund, I. E. (2012). Grønn omsorg fra deltager og tilbyderes perspektiv: delrapport i prosjektet Recovery-orienterte grønn omsorgstjenester [Green Care from participants and providers perspective. Sub report from the research project Recoveryoriented Green Care Services.] (Vol. nr. 4–2012). Elverum: Høgskolen i Hedmark
Hassink, J., & Van Dijk, M. (2006). Farming for health: Green-care farming across Europe and the United States of America. Dordrecht: Springer
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Haubenhofer, D. K.; Elings, M.; Hassink, J.; Hine, R. E. (2013). The development of green care in western European countries. https://habricentral.org/resources/16837
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Mallon G.P (1994). Cow as co-therapist: Utilization of farm animals as therapeutic aides with children in residential treatment. Child Adolesc. Soc. Work J. 1994;11:455–474. doi: 10.1007/BF01876570
Mourão, M. I.; Brito, L. (2015).Horticultura Social e Terapêutica, Hortas urbanas e atividades com plantas no modo de produção biológico. Publindústria, isbn: 9789897230318
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Scholl S., Grall G., Petzl V., Röthler M., Slotta-Bachmayr L., Kotrschal K. (2008) Behavioural effects of goats on disabled persons. Ther. Communities. 2008;29:297–309