A agricultura é um sector de actividade económica muito especial. Obviamente fundamental em qualquer sociedade civilizada, é geralmente associado a uma ideia de atraso tecnológico e cultural. Diversas circunstâncias e preconceitos, explicados pela História, explicam a persistência de tal ideia. Contudo, a realidade é diferente. A agricultura foi radicalmente modificada ao longo dos últimos 200 anos, pela introdução de métodos de produção industrial, com grandes ganhos em termos de produtividade.
À medida que entramos nas sociedades pós-industriais de “Terceira Vaga” descritas por Alvin Toffler em 1980, o computador substitui a máquina industrial (“Segunda Vaga”) tal como esta substituiu a enxada (“Primeira Vaga”). Não surpreende que a agricultura, mais uma vez, esteja a ser revolucionada, com destaque para a utilização de inteligência artificial. Vejamos as principais aplicações práticas.
Análise de dados
Qualquer exploração agrícola produz milhares de elementos de informação (dados) diariamente. O agricultor pode analisar as condições meteorológicas, utilização de água, temperatura do ar ou níveis de humidade no solo para tomar decisões informadas. Sistemas de análise permitem não só a recolha destes dados mas também o seu processamento, simplificando a tarefa do responsável.
Agricultura de precisão
Com dados detalhados, ao nível de cada árvore ou planta, é possível tomar micro-decisões em vez de aplicar determinado remédio ou medida de forma geral; este é o conceito de agricultura de precisão. Sensores individuais podem detectar o crescimento localizado de ervas daninhas ou de uma determinada doença, permitindo ao agricultor actuar em conformidade. A utilização de determinado herbicida pode assim ser limitada ao mínimo indispensável. A aplicação de rega gota a gota – excelente para evitar desperdícios – também integra o conceito de agricultura de precisão.
Meteorologia
A ciência meteorológica avançou imenso nos últimos 30 anos. A chave para este sucesso está na multiplicação mundial de equipamentos de recolha de dados (satélites, etc.,), no cruzamento de dados e no seu processamento por sistemas informáticos de simulação. Hoje em dia é possível efectuar previsões meteorológicas aproximadas, para a estação ou os meses seguintes, com bom nível de eficácia. E isso é essencial para o sucesso ou fracasso de uma colheita.
Drones
Qualquer agricultor dirá que nada substitui o estar no terreno e olhar o comportamento da colheita, a cada dia ou a cada semana. O uso de drones permite fazer isso mesmo, mas observando áreas de exploração bem maiores, de uma vez só. Os drones estão a tornar-se os novos “olhos” do agricultor no terreno.
Robots
O uso de robots e/ou de máquinas complexas dirigidas por um único operador trouxe imensos ganhos de produtividade. Assim acontece em olivicultura, com o uso de máquinas de colehita de azeitona a tornar-se corrente em Portugal. Na vitivinicultura, de acordo com o Dinheiro Vivo, está em curso uma parceria entre a Associação de Desenvolvimento da Viticultura Duriense e a Tekever para desenvolver o RoMoVi (Robot Modular e Cooperativo para Vinhas de encosta).
O trabalho do ISQ
De acordo com o Jornal Económico, o Instituto de Soldadura e Qualidade (ISQ) “está a desenvolver diversos projetos (…) para fomentar a agricultura inteligente em Portugal.” O artigo dá o exemplo do “InteliCROP – ESA SMALL ARTES”, que visa monitorizar as variáveis agrícolas, nomeadamente “identificar padrões e correlações em dados agroclimáticos específicos” de modo a fornecer elementos de apoio à decisão.
Os desafios do futuro
O uso de tecnologia avançada seria sempre indispensável numa lógica de concorrência livre entre empresas e países, na medida em que trouxesse ganhos de produtividade e eficiência. Mas o futuro traz ainda outros desafios específicos a esta actividade.
Alterações climáticas
O projecto InteliCROP do ISQ chama a atenção para a instabilidade climática que se verifica de um ano para o outro, de uma estação para a outra ou até com poucos dias de intervalo. Estes fenómenos estão associados às alterações climáticas e tornam a tarefa do agricultor mais difícil. A antecipação destes fenómenos e a mitigação das consequências precisarão do uso de “big data” e de técnicas de agricultura de precisão.
Flutuações de preço
A instabilidade climática ajudará a trazer mudanças bruscas na capacidade produtiva de empresas e países relativas a determinado bem ou produto. Essas mudanças podem traduzir-se em flutuações de preço igualmente bruscas, tanto a nível local como nacional ou até internacional. A recolha e processamento de dados ajudará os agricultores a antecipar, na medida do possível, estas flutuações.
Ciberameaças à infra-estrutura técnica
Deve ter-se em conta que o crescente investimento em infra-estruturas informáticas e ligadas à Internet e em rede traz novas vulnerabilidades. Tal como em qualquer outro sector de actividade, as empresas agrícolas estarão mais vulneráveis à acção de cibercriminosos, de vírus que tornem a estrutura inoperacional ou que comprometam a fiabilidade dos dados. A adopção de uma VPN (Virtual Private Network), criando um “escudo protector” para as actividades online da empresa, começará a ser encarada como um passo estratégico essencial.
Agricultura e Mar Actual