O Fórum para o Futuro da Agricultura (FFA), o principal evento onde agricultura e ambiente se encontram para um diálogo aberto, realiza-se anualmente em Bruxelas desde 2008. A última edição decorreu a 9 de Abril com a participação de 28 oradores de vários quadrantes da sociedade e cerca de 2.000 participantes.
A Syngenta e a ELO-European Landowners Organization são os promotores deste evento.
Prioridades para o futuro da agricultura e alimentação
Na palestra de abertura do FFA, a 12.ª directora executiva do Programa Alimentar Mundial da ONU, Ertharin Cousin, enunciou as prioridades para o futuro da agricultura e alimentação: acção colectiva para enfrentar os desafios da alimentação sem depender de programas de financiamento limitados no tempo; investimento em formação e tecnologia que atraiam os jovens à actividade agrícola; políticas e legislação que vão ao encontro das reais necessidades dos agricultores.
“Todos nós consumidores perdemos o contacto com a produção alimentar, mas queremos alimentos produzidos de forma sustentável, o que exige trazer mais jovens para a discussão sobre o que estas novas gerações querem e como podemos fazer a transição”, afirmou aquela responsável.
Alterações climáticas
Alterações climáticas — estamos a fazer o suficiente para as travar? À pergunta do primeiro painel da manhã, o comissário europeu para a Acção Climática e Energia, Miguel Arias Cañete, respondeu que a UE está empenhada em reduzir as emissões de gases com efeito de estufa em 40% até 2030 e que a agricultura tem um papel fundamental na mitigação e adaptação às alterações climáticas.
“Reduzir as emissões de gases com efeito de estufa para níveis baixos é um grande desafio para a agricultura, mas não é impossível e pode trazer múltiplas oportunidades de negócio e diversificação da actividade agrícola”, disse Arias Cañete, lembrando que o clima será um elemento central na futura Política Agrícola Comum (PAC) e no seu orçamento a longo prazo.
1/3 do orçamento da UE é destinado a financiar a agricultura
Na mesma linha de raciocínio foi a intervenção de Daniel Calleja Crespo, director-geral da DG ENVI da Comissão Europeia que afirmou que “será muito difícil justificar aos cidadãos europeus que 1/3 do orçamento da UE é destinado a financiar a agricultura se não fizermos mudanças substanciais na PAC (…) os agricultores que adoptem práticas sustentáveis terão apoios pelos serviços de ecossistemas que prestarem”, garantiu.
Já Jean-Marc Bournignal, director-geral Associação Geral de Produtores de Trigo de França, respondeu que “os agricultores têm de ter lucro para poder investir em inovação” e que “as políticas públicas têm de incentivar esta inovação, ser consistentes e gerar confiança nos agricultores”.
Segundo este agricultor, um exemplo de como se pode gerar confiança nos consumidores é a certificação HVE (Haute Valeur Environnementale) existente em França e que já certificou cerca de 1.500 explorações agrícolas com base nos seus indicadores de performance ambiental e biodiversidade.
Financiar a Sustentabilidade: que crescimento no século XI?
Por sua vez, Wiebe Draijer, administrador do Rabobank, orador principal neste painel, disse que o sistema alimentar é o mais afectado pelo aquecimento global do planeta e por isso é necessária uma mudança onde todos os actores mudem ao mesmo tempo e na mesma direcção.
“A PAC tem a potencialidade de operar esta mudança. Apelo aos decisores políticos que se comprometam com a redução das emissões para travar o aquecimento global”, disse Wiebe Draijer, acrescentando que “os agricultores têm um papel importante na mitigação das alterações climáticas, mas devem ser apoiados pela redução das emissões nas suas explorações agrícolas”.
Segundo Wiebe Draijer, a politica actual do Rabobank, especializado em financiamento agrícola, passa por analisar a gestão global que o agricultor faz da sua terra e não apenas o projecto de investimento.
Jeremy Oppenheim, fundador e sócio da Consultora SYSTEMIQ, reconheceu que será necessária uma grande transformação para aumentar a produção de alimentos e reduzir emissões, pelo que “investir na próxima geração de empreendedores e no capital natural será crucial para o futuro da agricultura”, defendendo que os subsídios devem ser focados no apoio à mudança para práticas agrícolas sustentáveis.
Uma PAC para a nova geração?
“Os agricultores e as comunidades rurais da Europa fazem parte da solução e não do problema, mas temos que fazer mais e ser mais céleres para reduzir o impacto do sector agro-alimentar no clima e no Ambiente”, afirmou o comissário europeu da Agricultura, Phil Hogan, revelando que esta actividade é responsável por 10% das emissões de gases com efeito estufa (excluindo o dióxido de carbono) na UE .
Phil Hogan reconheceu que os apoios públicos dados aos agricultores no âmbito da futura PAC para responder a estes desafios devem ser mais atractivos. A arquitectura verde da nova PAC, proposta pela Comissão Europeia, assenta em três eixos de apoios: condicionalidade (incluindo as actuais medidas do greening); eco-esquemas no I Pilar (obrigatórios para os Estados-membros, mas voluntários para os agricultores) e medidas no II Pilar (o agricultor adere voluntariamente e é remunerado por práticas agro-ambientais e de mitigação das alterações climáticas).
Boas práticas ambientais
Os apoios ao rendimento serão, assim, condicionados ao cumprimento de boas práticas ambientais e climáticas. “Espero que usem a vossa influência para incentivar os co-legisladores da UE a aprovarem estas propostas e a chegarem a um acordo sobre o próximo orçamento da UE o mais rapidamente possível”, apelou o Comissário.
Apesar do discurso politicamente correcto de Phil Hogan, levantaram-se algumas vozes contrárias neste painel. “Não estou tão optimista como o Comissário Phil Hogan, há o risco de a PAC ser vista como um falhanço. O futuro Parlamento e Conselho Europeu vão ter que decidir”, disse Faustine Bas-Defossez, analista do Institute for European Environmental Policy, um think tank ambientalista europeu.
Nova geração de agricultores e consumidores
A geração Y, também conhecida por Millennials (pessoas nascidas entre 1980 e o ano 2000), é motivada pelo consumo sustentável. As tendências vieram para ficar e há pelo menos 9 milhões de consumidores preocupados com o desperdício alimentar e que optam por comprar a comida que sobra no fim do dia.
A experiência foi relatada por uma responsável da aplicação para telemóvel “Too Good to Go”, um projecto nascido no Reino Unido e que põe em contacto consumidores e lojas para que os alimentos que sobram no final do dia não acabem no lixo.
“Precisamos de milhares de soluções para resolver o problema do desperdício alimentar porque é complicado, só agora estamos a começar”, disse Mette Lykke, responsável da App “Too Good to Go”, estimando que o desperdício alimentar é responsável por 8% das emissões de gases com efeito de estufa.
Ciência aplicada à horticultura
A ciência aplicada à horticultura também pode ajudar a minimizar o problema do desperdício alimentar. A empresa norte-americana Apeel Sciences mostrou como usa componentes extraídos de plantas para produzir revestimentos comestíveis aplicados em frutas e legumes, com vista a aumentar a vida de prateleira destes produtos perecíveis.
Esta segunda pele forma uma barreira natural, evitando a entrada de patógenos e a degradação dos tecidos vegetais por oxidação. Desta forma os produtos podem percorrer maiores distâncias até aos supermercados e duram mais tempo em boas condições, minimizando o desperdício alimentar.
A tecnologia está a ser aplicada em em espargos, citrinos e abacates, à venda em cadeias de supermercados norte-americanas. Os seus promotores já conseguiram um financiamento de 110 milhões de dólares. “Cerca de 40% da comida que produzimos nunca é consumida. É um mercado que vale 3 mil milhões de dólares”, disse a jovem cientista e empresária Jenny Du.
Janez Potočnik, presidente da fundação RISE e presidente do FFA, encerrou a conferência fazendo votos de que o FFA inspire uma mudança real para um mundo atractivo às próximas gerações.
Agricultura e Mar Actual