Para diminuir os danos ambientais causados pelas embalagens plásticas, um grupo de cientistas brasileiros usou os restos do abate de bovinos e suínos para desenvolver filmes e embalagens biodegradáveis para alimentos. A novidade é resultado de uma série de estudos feitos pelo Centro de Pesquisa em Alimentos da Universidade de São Paulo. O material, originado da cartilagem, dos ossos e da pele dos animais, decompõe-se seis semanas após ser deitado fora e pode ser ingeridos pelos seres humanos.
No Food Research Centre (FoRC), da Universidade de São Paulo, investigadores como os Paulo José do Amaral Sobral e Carmen Tadini dedicam-se a investigar novos materiais para embalagens, baseados em biopolímeros de fontes renováveis, lê-se na página da instituição. Sobral trabalha atualmente com gelatina, uma substância obtida a partir de resíduos da indústria do abate de bovinos (ossos, couro, cartilagem) e suínos (pele), por meio da separação e do tratamento do colágenio (o tecido conjuntivo que segura a estrutura muscular nos ossos).
Os professores da USP já chegaram a um material com características semelhantes aos polímeros sintéticos (plásticos), mas este é sensível à humidade do ambiente. A solução pode estar no uso de nanotecnologia, afirmam.
“É uma proteína produzida no mundo inteiro, pois a sua origem é uma matéria prima abundante e, no geral, de custo reduzido; por isso escolhemos a gelatina. Além disso, ela tem boas propriedades, como a de formar filmes, por exemplo”, salienta Sobral.
A investigação continua
Sobral trabalha também no desenvolvimento de filmes e recobrimentos comestíveis e biodegradáveis (chama-se recobrimento à embalagem aplicada ao alimento, como se estivesse colada). “Usamos plastificantes, como a glicerina, ou seja, polióis, que são equivalentes aos açúcares, embora não sejam calóricos.” O professor alerta que o adjectivo “comestível”, aqui, refere-se a uma possibilidade, e não a um hábito ou obrigatoriedade. “Depende muito da higiene, do local onde o alimento foi guardado”, diz.
Segundo o engenheiro de alimentos da USP, sendo uma proteína de origem animal, este material é naturalmente biodegradável. “Se a pessoa não o consumir e descartar, ele vai desaparecer em cerca de seis semanas, em contacto com o solo. Os micro-organismos do solo, sobretudo os fungos, consomem o material e transformam tudo nos componentes mais elementares possíveis”, explica.
Contudo, ainda há algumas limitações para que o produto seja considerado apto a ser utilizado sem ressalvas. “Tanto a gelatina quanto os plastificantes que usámos, como o glicerol (um subproduto da indústria de biocombustível), são de origem natural e têm grande capacidade de absorver o vapor de água contido no ar”. O problema aqui é que as características do material mudam quando o produto absorve vapor de água, ficando pegajoso. Hoje, este produto teria uma aplicação limitada a regiões muito secas. Mas as pesquisas para o melhorar continuam”, relata Sobral.
Além de tentar modificar as proteínas utilizadas e de testar novos aditivos, o cientista está a tentar também a nanotecnologia para dar conta do problema. “Estamos testando a aplicação de nanopartículas de argila, que têm capacidade de diminuir um pouco essa sensibilidade do material à humidade”. Os investigadores usam a montmorinollita – uma argila natural – e a laponita, que é sintética.
Mas há ainda mais possibilidades no desenvolvimento deste produto. Os cientistas procuram dar novas funções ao material de embalagem: antioxidante e antimicrobiana, adicionando à estrutura, por exemplo, óleos essenciais e outros produtos naturais.
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