O Governo, em Conselho de Ministros, aprovou no passado dia 21 de Março, um conjunto de diplomas para a efectivação da Reforma da Floresta. Mas os responsáveis pela CAP – Confederação dos Agricultores de Portugal dizem que não se trata de uma Reforma, mas de “um conjunto heterogéneo de diplomas legais e de propostas legislativas de mérito político, consistência técnica e resultados expectáveis muito diversos”. Para a CAP, o conjunto de medidas “não ataca o problema dos incêndios florestais, agrava o desordenamento dos espaços florestais, e fragiliza a economia do sector florestal e promove o abandono florestal”.
A CAP não se identifica com o “proclamado consenso em torno desta Reforma da Floresta”, entende mesmo que algumas das suas medidas “terão efeitos muito negativos e irreversíveis para a produção florestal no País e que a resolução do problema dos incêndios florestais se encontrará tão afastada quanto o estava antes da sua aprovação pelo Governo”.
Por estas razões, a CAP irá solicitar audiências ao Presidente da República e aos partidos representados na Assembleia da República, instâncias políticas decisivas e finais no percurso da Reforma da Floresta, para lhes dar a conhecer a sua posição e reservas relativamente à mesma.
Em comunicado, a CAP diz que o Conselho de Ministro da passada terça-feira foi uma reacção “ao que foi o pior ano de incêndios da última década – em 2016 ardeu uma superfície total de mais de 160 mil hectares”.
“Tendo vindo a ser apresentada pelo Governo como sendo largamente consensual, a CAP vem hoje publicamente e no momento da sua aprovação, afirmar publicamente que não é assim e que, pelo menos no que lhe diz respeito, ela não só não tem a sua aprovação como alguns dos seus elementos fundamentais suscitam reserva ou mesmo discordância”, pode ler-se no comunicado.
Defesa da floresta contra incêndios
No que diz respeito à eficácia do Sistema de Defesa da Floresta contra Incêndios (SDFCI), a CAP refere que “desde logo, é no mínimo estranho que uma ‘reforma’ nascida para resolver, ou pelo menos minorar expressivamente, o problema dos incêndios florestais, consista num conjunto de medidas que, na sua quase totalidade, não produzirão directamente qualquer efeito na sua mitigação e que os seus resultados, sempre de natureza difusa, só possam vir a ser avaliados num muito longo prazo”.
Considerando a circunstância em que a “Reforma da Floresta” foi decidida e o alcance que o primeiro-ministro lhe pretendeu atribuir, “seria de esperar que incidisse especialmente sobre a estruturação do Sistema de Defesa da Floresta contra Incêndios (SDFCI)”, considera a Confederação.
“Estranhamente, é precisamente isso que não é feito. O Plano Nacional de Defesa da Floresta Contra os Incêndios (PNDFCI) permanece virtualmente intocado e os resultados da sua aplicação aparentemente não são minimamente tidos em conta nesta reforma”, considera a CAP.
Os representantes dos agricultores afirmam ainda que a avaliação externa do PNDFCI – “vários anos atrasada, mas, ao que se sabe, executada – não é divulgada nem é tida em conta pelo Governo na ponderação das alterações ao SNDFCI que promove”. “Mas como é possível ignorar, especialmente em 2016, o desfasamento entra as principais metas operacionais do PNDFCI e os resultados efectivamente verificados?”, acrescentam.
“A CAP não compreende como a questão da falta de eficiência do combate aos incêndios é completamente ignorada nesta ‘reforma’ e apenas se visa a dita gestão da floresta”.
O papel das autarquias
Sobre o reforço do papel das autarquias na condução da política florestal, diz o mesmo comunicado que um dos aspectos que a CAP critica nesta “reforma” é o de que “necessidades políticas circunstanciais deste Governo determinem que em quase todos os diplomas as autarquias locais sejam objecto de atribuições ou favorecimento, mesmo quando não se vislumbra razão objectiva para tal”.
Discordando, nuns casos, do fundamento para a atribuição de tais competências e, noutros, na forma como elas se corporizam, a Confederação diz que “há, no entanto, duas situações, relacionadas, que se consideram profundamente danosas para a floresta do nosso País”, tais como “a pretendida transposição para os Planos Directores Municipais (PDM) de disposições dos futuros Programas Regionais de Ordenamento Florestal (PROF); e a atribuição às câmaras municipais do poder efectivo do licenciamento da arborização e da rearborização ao estabelecer que o seu parecer na matéria, favorável ou desfavorável, é vinculativo.
As disposições dos PROF “não são directamente vertíveis para os PDM. Enquanto estes últimos lidam com a regulação da ocupação física do território municipal, procurando o equilíbrio entre os diversos usos do solo, aqueles lidam com a organização – não ocupação – dos territórios florestais e respectivas normas silvícolas, a uma escala (muito) supra-municipal”, acrescenta a CAP.
“Assim, não se vê como é que se poderá transpor seja o que for de um PROF para um PDM e, muito menos, o que possa conduzir a um parecer de força vinculativa”, acrescenta a mesma nota.
Plantação de eucaliptos
Sobre a proibição de plantação de eucaliptos em novas áreas, diz a CAP que o Governo, sob o “pretexto ilusório” de “limitar a expansão a que se se assistiu do género Eucalyptus sp., em detrimento de espécies autóctones” consagra a “mais negativa e destruidora medida desta sua reforma”.
Para aqueles responsáveis, ao proibir a instalação de novos povoamentos de eucalipto, para além do “evidente depauperamento do sector florestal português e das limitações à competitividade da fileira florestal do eucalipto, terá consequência secundárias perversas de um enorme potencial destruidor”. Os terrenos incultos de aptidão florestal ao serem arborizados com outras espécies, que não o eucalipto, “passarão a ter o ónus perpétuo de não poderem ser convertidos para esta espécie, pelo que será expectável que a já reduzida apetência para a arborização com outras espécies florestais seja ainda mais mitigada”, acrescentam.
Na ponderação da conversão dos actuais povoamentos de eucalipto para utilizações agrícolas diversas, a impossibilidade de retomar a actual ocupação “poderá condicionar fortemente as utilizações previstas, nomeadamente, as de mais baixa rentabilidade ou de duração mais breve. Inversamente, os terrenos hoje ocupados por povoamentos de eucalipto beneficiarão de uma mais-valia fundiária tanto mais injustificada quanto são já, em princípio, dos terrenos florestais mais rentáveis do País”, salienta a CAP.
“Esta medida, que pode ser considerada paradigmática desta Reforma da Floresta, assenta num preconceito contra a rentabilidade de um sistema produtivo – e num conjunto de mitos ambientais que a ciência e a evidência prática se encarregaram de desmontar – e promoverá indiscutivelmente a sua fragilização”, frisa o comunicado.
Agricultura e Mar Actual