A Coligação para o Controlo das Pescas da UE aplaude os vários passos positivos dados pelo Parlamento Europeu no sentido de uma pesca mais transparente e de pescado rastreável. Mas garante que os eurodeputados abriram “uma lacuna”, ao permitirem possibilidade de omissão de 40% das capturas.
“Dois passos para a frente, um enorme passo atrás”, considera a Coligação para o Controlo das Pescas da UE.
Com a sua votação em plenário esta semana, os eurodeputados apelaram a que todas as embarcações de pesca comuniquem tudo o que capturam, incluindo espécies sensíveis e protegidas, o que disponibilizará pela primeira vez dados de mais de 49.000 embarcações da UE.
Além disso, as embarcações de pesca da UE serão rastreadas através de instrumentos electrónicos de monitorização, o pescado no mercado da UE será rastreável digitalmente desde a rede até ao prato, e os Estados-membros da UE serão obrigados a informar de forma mais transparente sobre as suas medidas de controlo.
Omissão de capturas
Simultaneamente, a decisão de retroceder significativamente em termos da comunicação exacta das capturas “lança uma sombra sobre o resultado da votação, uma vez que até 40% das capturas podem agora ser omitidas dos registos da frota pesqueira da UE (e até 50% no caso do atum). Isto prejudicaria os dados científicos que permitem avaliar o estado dos recursos pesqueiros, poderia tornar ineficazes os esforços de controlo das pescas e colocaria seriamente em risco os progressos conseguidos na última década para a sustentabilidade do pescado e para a recuperação de certas espécies marinhas – como a própria Comissão Europeia alertou”, refere um comunicado da Coligação.
Em nome da Coligação para o Controlo das Pescas da UE, Marta Marrero Martin, directora de governação dos oceanos da organização The Nature Conservancy, afirmou que “hoje, os eurodeputados mostraram a coragem necessária para mudar a maré de sobrepesca, votando para tornar obrigatória a monitorização electrónica remota em embarcações que se encontram em risco elevado de não cumprir as regras”.
Mas acrescentou que “infelizmente, esta situação é ofuscada pela votação a favor de alargar a chamada “margem de tolerância” para os pescadores, que permitirá que até 40% do pescado não seja incluído nos registos, sinalizando um enorme golpe para a sustentabilidade. Os eurodeputados e os Estados-Membros devem inverter urgentemente este rumo nas suas próximas negociações, procurando ir mesmo mais longe ao garantir que as câmeras registam as capturas acessórias de espécies sensíveis e protegidas”.
Para Andrea Ripol, técnica de política de pescas na Seas At Risk, “a votação de hoje é um resultado misto para golfinhos, aves marinhas e tartarugas em toda a UE. Embora a recolha obrigatória de dados sobre capturas acidentais em diários de bordo seja uma decisão ousada e promissora para reverter a perda de biodiversidade, a rejeição da instalação de sistemas de monitorização electrónica remota para recolha de dados sobre a captura destas espécies prejudica a sua eficácia, uma vez que é uma ferramenta essencial para garantir que os dados são registados com precisão”.
Contra a pesca ilegal
Por sua vez, Katrin Vilhelm Poulsen, técnica superior de políticas de pescado do Gabinete de Política Europeia da WWF, afirmou que “devido ao facto de a UE importar a maioria do pescado que consome, a introdução da rastreabilidade digital desde o mar até ao prato reforçará a luta da UE contra a pesca ilegal e lançará as bases para fornecer informações claras aos consumidores europeus. No entanto, este marco na luta contra a pesca ilegal a nível internacional é prejudicado pela decisão paralela de legalizar a subdeclaração das embarcações de pesca europeias”.
Vanya Vulperhorst, diretora de campanha, pesca ilegal e transparência da Oceana afirmou: “Congratulamo-nos com o resultado de que todas as embarcações de pesca da UE – incluindo 49 000 navios de pequena escala – terão de comunicar as suas capturas e partilhar a sua localização, e que os Estados-Membros já não podem esconder informações sobre os seus esforços de controlo por parte do público. Contudo, o voto insensato dos eurodeputados a favor da subdeclaração dos pescadores até 40% das suas capturas corre o risco de reverter décadas de recuperação das populações de peixes”.
E para Steve Trent, director executivo da Environmental Justice Foundation, “relatórios mais transparentes dos Estados-membros da UE sobre os seus controlos nas pescas e a abolição do seu veto relativamente à publicação de informações sobre as pescas significam que a UE pode continuar a ser pioneira nos esforços para um sector das pescas global transparente. No entanto, e crucialmente, a enorme falha criada ao permitir que 40% do pescado desapareça dos registos tem agora de ser urgentemente corrigida pelos deputados e pelos Estados-Membros nas suas próximas negociações”.
Já Gonçalo Carvalho, coordenador executivo da ONG portuguesa Sciaena, referiu que “de um ponto de vista da realidade portuguesa, a votação de hoje foi muito positiva pois os eurodeputados reconheceram a importância de monitorizar devidamente a pequena pesca para a poder gerir de forma sustentável, mas também de poder diferenciar e valorizar o pescado capturado em águas nacionais. Agora, esperamos que a Presidência Portuguesa tenha um papel positivo para ajudar a definir uma posição do Conselho que não só partilhe destas preocupações, mas que também reconheça a necessidade de contabilizar todo o pescado capturado, ao manter as margens de erro a níveis baixos”.
Agricultura e Mar Actual