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Sílvia Domingues, SGS: “Quem quer exportar procura logo certificação, é um requisito”

Entrevista a Sílvia Domingues, Directora Executiva  do Agriculture, Food and Life da SGS Portugal

Sílvia Domingues diz que a certificação é meio caminho andado para a exportação de produtos agrícolas. E aponta como novos mercados a apostar os dos frutos de casca rija, como a amêndoa e a noz.

Para quem não sabe, o que faz a SGS na área da certificação agrícola?
A SGS não trabalha apenas na área da certificação agrícola, trabalha em muitas áreas. É uma multinacional que trabalha na área da certificação, da inspecção, das análises e na área da formação. Sendo que a área da agricultura é um dos sectores em que actualmente estamos a apostar. O que fazemos e desenvolvemos nesta área é precisamente a certificação, a inspecção, essencialmente apenas quando é solicitado algumas questões específicas que envolvam seguros.

Pode exemplificar?
Imagine que tem um pomar e que exporta fruta para o Norte da Europa e quando o contentor chega lá ou está aberto ou tem uma anomalia qualquer no produto. Aí pode solicitar ajuda a uma entidade independente, como é a SGS. Nós podemos fazer essa inspecção, ou aqui à saída, a dizer que o produto foi todo colocado em condições, e também a pode fazer à chegada quando existe um problema com o produto.

“A parte da certificação é o reconhecimento das boas práticas da agricultura.”

A parte da certificação é o reconhecimento das boas práticas da agricultura de acordo com determinados referenciais específicos nesta área, depois temos a parte das análises que acompanha e vai testemunhar a parte da produção. Por exemplo, quando faz uma produção tem de testemunhar ou acompanhar com análises e pode ter de emitir um certificado de um lote com determinado tipo de análises. Num caso específico, se é um produto biológico não pode ter determinado tipo de resíduos de pesticidas. Essa é uma das coisas que a SGS faz na área das análises.

E tem também a formação.
Sim. Cada vez mais estamos a entrar, felizmente, numa área que foi abandonada durante muitos anos, regressámos à agricultura agora, temos uma aposta relativamente recente nesta área, é um sector que está a crescer mas que nunca foi acompanhado tecnicamente como deve ser. As pessoas faziam agricultura como os avós faziam e hoje em dia a agricultura é muito mais do que isso. Há centros técnicos, há técnicos e expertises e know how associado à produção de framboesas, de cogumelos, de milho, do que for, que poderá sempre ser aplicado na produção para potenciar a produtividade e melhorar a qualidade do produto final. A SGS actua em todas estas áreas. Estamos a falar de uma cadeia da certificação que depois pode ser acompanhada, ou não, pela inspecção, pode ser acompanhada, ou não, pela área das análises e acompanhando sempre com a formação em toda a cadeia, do início ao fim.

As empresas agrícolas portuguesas estão a aderir mais à certificação?
As empresas que querem exportar têm mesmo de aderir à certificação. Hoje em dia a grande mais-valia da agricultura são as condições climatéricas que Portugal tem. Temos muitas horas de sol, um Verão de alguma maneira grande quando comparado com os outros países da Europa, o que nos permite ou antecipar a produção de alguns produtos ou produzir durante mais tempo. Temos apostado na qualidade, mas sempre que vamos para a exportação quem importa quer alguma garantia. E a primeira garantia que pede é a certificação.

De que tipo de certificação?
Estamos a falar de uma certificação MPB (modo de produção biológico), ou uma certificação Global GAP, são certificações sempre reguladas por referenciais internacionais que falam sempre do modo de produção e do que se tem de exigir, ou cumprir, para que o produto seja reconhecido de acordo com aquela certificação. Dentro da área da exportação, é a garantia de quem está a importar de que está a comprar um produto onde houve boas práticas durante a sua produção. Cada vez mais, como sabemos é que a China e a Índia produzem tudo e mais alguma coisa e depois as boas práticas não são garantidas.

“A China e a Índia produzem tudo e mais alguma coisa e depois as boas práticas não são garantidas”.

Nós aqui estamos a falar de produtos bios, que são acompanhados por um sistema regulado por um referencial, que deve ser cumprido. A certificação é a prova de que há uma entidade externa que vai ao local, audita todo o processo e diz, ok, esta produção foi feita de acordo com este tipo de referencial e este caderno de encargos.

Tem exemplos de empresas que só tenham conseguido colocar produtos lá fora depois de recorrerem à certificação?
Não tenho. Como normalmente acaba por ser um requisito de quem compra, quem quer exportar vai logo à procura da certificação, é um requisito.

Sem certificação não há exportação?
Já não se consegue exportar sem certificação, essencialmente é isso. Isto se estamos a falar de uma área muito específica como a MPB. Se estivermos a falar de um produto tradicional, eventualmente consegue exportar sem certificação. Se estiver a falar do modo de produção biológico, aí tem de ter a certificação associada, senão como pode garantir que é biológico? Não consegue.

O mercado evoluiu muito nessa área, existem muitas análises que acompanham estas certificações para garantir que não poderão ser colocados alguns fertilizantes. Até porque existe ainda a ideia de que o biológico não existe, mas não é verdade. Mesmo pequenos resíduos são apanhados nas análises. E quem está a importar um produto biológico, creio que não corre o risco de dizer que está a comprar um produto mais caro e depois estar a importar um produto tradicional.

Que certificação fazem nos produtos tradicionais?
Fazemos no Global GAP, fazemos as ISO 9001, as ISSO 18901 associadas à qualidade, as 14000 associadas ao ambiente, as 18000 associadas à segurança. Na parte da certificação somos a empresa internacional líder de mercado.

Quais os produtos em que lhe têm pedido mais certificação?
Essencialmente nas frutas e nos produtos hortícolas. Se bem que há uma área que está a crescer, porque está muito bem internacionalizada já, que é a parte dos vinhos. Os produtores começaram agora a aparecer com vinhos biológicos, que não são ainda reconhecidos pelo mercado, porque é relativamente recente, mas acaba por ser a tendência do mercado.

“O vinho é um produto que está muito bem internacionalizado.”

O vinho é um produto que está muito bem internacionalizado, é um produto que se exporta muitíssimo bem em Portugal, temos uma grande experiência na produção de vinha e de bom vinho, não em grande quantidade mas em qualidade. E começámos agora a apostar no modo de produção biológico também para vinho. É uma tendência de mercado.

“Portugal tem certificados cerca de 250 mil hectares de modo de produção biológico.“

Mas ainda são poucos.
Sim, ainda são poucos vinhos e poucos hectares. Actualmente, Portugal tem certificados cerca de 250 mil hectares de modo de produção biológico.

No vinho?
Não. No geral, vinhos e outros produtos.

Dos vossos clientes, para que países vendem mais?
Estão a vender muito para a Europa de Norte.

A certificação ainda é cara para as empresas?
Isso depende da análise. Se uma empresa quiser um MPB onde não investiu na quantidade e na qualidade, eventualmente fica caríssimo. Porque requer um tipo de fertilizantes orgânicos que se destroem ao longo do tempo, mas que comparado com os fertilizantes tradicionais é muito mais caro. Por isso um MPB tem de ser dimensionado e tem sempre de apostar na quantidade.

“Se estivermos falar de 1 hectare de milho, a certificação de milho, a certificação é caríssima. Se estivermos de 1 hectare de framboesas é baratíssima.”

E isso vem colidir com o expertise que é necessário cada vez mais utilizar na agricultura. Hoje não podemos ficar à espera de que se chove se faz uma boa colheita e se faz granizo acaba-se com a colheita. Isto tem que ser de alguma maneira prevenido. E existem mecanismos que podem perfeitamente diminuir o risco. E uma vez que conseguimos controlar a produção em momentos mais críticos, conseguimos colocar sondas e conseguimos estar mais em cima da produção e com isso conseguimos também assegurar alguma produtividade. Se aplicarmos as boas práticas de uma certificação, conseguimos assegurar no final quantidades mínimas e as qualidades requeridas. Por isso a ideia de que a certificação é cara depende da realidade que estamos a analisar.

Se estivermos falar de 1 hectare de milho, a certificação de milho, a certificação é caríssima. Se estivermos de 1 hectare de framboesas é baratíssima.

Porquê?
Porque a framboesa produz mais e o produto é vendido a um outro preço que não o do milho. E estamos sempre a falar de 1 hectare.

Quais as vantagens em fazer a certificação na SGS?
Estou perfeitamente convicta que um produtor que avança com um certificado SGS dentro de um contrato comercial de um produto hortícola no mercado internacional… Estou a trabalhar com a SGS, querem maior credibilidade e confiança do que isto? Não existe. Somos reconhecidos e válidos a nível mundial.

O ministro da Agricultura tem dito que quer duplicar as exportações de hortícolas em quatro anos. Como conhece bem o sector produtivo português, acha que se consegue?
Conseguimos com outro tipo de investimento e com outro tipo de sensibilização. Eu costumo dizer que quando fazemos mais do mesmo obtemos o mesmo. Se aumentarmos a sensibilização para as boas práticas, se aumentarmos a sensibilização para os produtores de que se de facto aplicarem boas práticas na agricultura conseguem ter outro tipo de resultado. E também se sensibilizarmos os agricultores e as associações que conseguem diminuir o risco para garantir uma maior quantidade de produção no final, aí consegue-se. Agora, só baseado no fazemos mais do mesmo só porque temos mais subsídios, vamos ficar iguais.

“Estou a falar de amêndoas e das nozes. Temos condições fantásticas do Norte a Sul do País para esta produção.”

Se pudesse aconselhar os nossos produtores, que produto escolhia como aposta na exportação?
Actualmente, temos excelentes exemplos dos pequenos frutos, é uma área que é muito procurada e a produção basicamente está vendida antes de terminar a campanha. Uma outra área que ainda não é tão visível em Portugal, mas que temos excelentes condições climatéricas para desenvolvimento são os frutos de casca rija. Estou a falar de amêndoas e das nozes. Temos condições fantásticas do Norte a Sul do País para esta produção. Estamos sempre a falar de produtos com valores diferenciados, não estamos a falar de alface e tomate. Esses também são essenciais, com certeza que sim, e eu quero continuar a comer as boas saladas portuguesas, mas também temos muita área ainda que pode ser cultivada com produtos de valor diferenciado. Já para não falar dos vinhos.

É de apostar no vinho biológico?
Sim, penso que sim. Temos um know how tão grande a nível de conhecimento enológico, já temos a marca do vinho português tão destacada em tantos mercados, porque não apostar no vinho biológico?

E em que países aconselhava a exportação?
Nos frutos de casca rija, nós continuamos a importar. Por isso, se aumentássemos a nossa produção conseguíamos aqui de uma forma indirecta diminuir os custos da importação. Somos elevados consumidores de frutos de casca rija, estou a falar essencialmente de amêndoas e nozes, e importamos toneladas de frutos de casca rija de sítios completamente duvidosos, como a Índia. Seria até interessante para o mercado interno. No que diz respeito às framboesas, há uma grande procura na Europa do Norte.

Mudando um pouco de assunto. Muitos produtores biológicos dizem que os seus produtos só chegam muito mais caros aos mercados porque não são tão subsidiados como os produtores da agricultura tradicional. Isto é verdade?
Não propriamente. O produto biológico é mais caro porque se produz em menor quantidade, porque o próprio consumidor, por ser ligeiramente mais caro, consome mesmo, e mantém o produto biológico nas prateleiras das grandes superfícies durante mais tempo.

Ao mesmo tempo, o consumidor está completamente desinformado sobre os benefícios do consumo de um produto biológico versus o consumo de um produto tradicional. Mas, há lugar para as duas. Não é pensar em anular a agricultura tradicional e vamos só produzir biológico. Não é nada disso. Se o consumidor final valorizasse o produto biológico iria seguramente fazer diminuir os custos. Porque estamos sempre aqui a falar de menos tempo de prateleira, que é caro nos supermercados. Há aqui alguma desinformação sobre os benefícios do produto biológico, a nível de saúde, a nível ambiental, o consumidor final não está totalmente informado sobre estes benefícios.

E também não está informado sobre a sustentabilidade da agricultura biológica, que é um pilar muito importante quando comparado com a agricultura tradicional. Mas isso também tem a ver muito com a nossa forma de consumo e aquilo que procuramos. Os portugueses ainda procuram um produto que seja mais barato cinco cêntimos que outro. Já começa a ter mais informação mas poderia ser mais disponibilizada.

A quem cabe essa tarefa de disponibilizar a informação?
A todos nós. Estou a falar das empresas que certificam, das empresas que comercializam, das próprias associações, isto é um plano conjunto a nível de comunicação ao consumidor final.

Agricultura e Mar Actual

 
       
   
 

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