Artigo de opinião de Vasco da Silva, Coordenador de Florestas e Vida Selvagem da ANP|WWF
O coelho-bravo (Oryctolagus cuniculus) é uma espécie quase exclusiva da Península Ibérica e um elemento-chave nos ecossistemas mediterrânicos, nos quais desempenha um papel fundamental como modelador da paisagem e como presa de várias espécies de predadores, como o lince-ibérico ou a águia-imperial.
É também uma espécie com grande relevância económica, por ser uma das mais importantes peças de caça menor. Paralelamente, é também a espécie que mais danos causa na agricultura em Espanha, principalmente em áreas onde há excesso populacional. Mas em grande parte do território ibérico a espécie tem vindo a sofrer um declínio acentuado devido aos surtos de doenças, estando atualmente classificada segundo os critérios da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) como “Vulnerável”.
Não esqueçamos que, ao promover uma melhor gestão das populações de coelho-bravo, estamos a contribuir para melhorar o estado das populações dos seus principais predadores, como o lince-ibérico
Tendo em conta a importância desta espécie nos nossos ecossistemas e na nossa economia, é fundamental que existam projetos dedicados à sua conservação. O projeto LIFE Iberconejo visa implementar um sistema de governança para a gestão integrada do coelho-bravo na Península Ibérica, colmatando lacunas de conhecimento sobre o estado atual das populações e averiguando quais as melhores práticas para a gestão da espécie. Já decorre no terreno o protocolo de seguimento para avaliar as populações por especialistas de Portugal e Espanha num processo colaborativo.
Para implementar o protocolo sanitário e de danos na agricultura, as diferentes entidades envolvidas neste projeto – ambientalistas, cientistas, agricultores, caçadores e administrações públicas – reuniram recentemente em Madrid e aprovaram a metodologia de monitorização, incluindo os modelos para obter um mapa de abundância de coelho-bravo na Península ibérica e a plataforma onde se irão carregar os dados para serem analisados à escala ibérica. A informação gerada através do protocolo de seguimento sanitário permitirá detetar focos de doença e avaliar o estado das populações. Assim, teremos a base para uma gestão a longo prazo do coelho-bravo, o que vai permitir preservar a sua função ecológica e reduzir os conflitos associados.
Não obstante projetos como este serem fundamentais para implementar medidas efetivas de conservação no terreno, é imprescindível que os vários agentes tenham à sua disposição fundos para apoiar a execução destas medidas. Por exemplo, o apoio financeiro através do novo Plano Estratégico da Política Agrícola Comum (PEPAC), que é fundamental na gestão do território rural, é uma importante ferramenta para a implementação de práticas que preservem as terras agrícolas e cumpram normas de segurança alimentar, ambientais e de bem-estar animal – e deve ser orientado nesse sentido. Não esqueçamos que, ao promover uma melhor gestão das populações de coelho-bravo, estamos a contribuir para melhorar o estado das populações dos seus principais predadores, como o lince-ibérico.
Impulsionar a comunicação entre as partes interessadas e uma melhor governança ambiental é fundamental para reverter as tendências de declínio das populações de vida selvagem, mas orientar as políticas públicas e pensar os planos estratégicos e seu financiamento, continua a ser a grande chave para o regresso bem sucedido da fauna selvagem à paisagem portuguesa. Trabalhemos então nesse sentido.
Agricultura e Mar