Luís Capoulas Santos, já não é ministro da Agricultura, Florestas e Desenvolvimento Rural, Ministério que acabou no XXII Governo Constitucional, repartido por três áreas. Mas, agora deputado na Assembleia da República, ainda tem direito a opinião na revista da RRN (Rede Rural Nacional) “emRede n.º9”, que já se encontra disponível online, dedicada ao tema “O Regadio no Desenvolvimento Territorial”.
O agriculturaemar.com aqui deixa transcrita a opinião de Capoulas Santos, na revista da RRN, com o título “Novos Desafios das Políticas Públicas para o Regadio em Portugal”.
Luís Capoulas Santos
“O fomento do regadio constituiu assumidamente uma prioridade política do XXI Governo Constitucional. Com efeito, o Programa do Governo previa a elaboração de um Programa Nacional de Regadios, visando a expansão, reabilitação e modernização dos regadios existentes e a criação de novas áreas regadas, com o objectivo de promover o regadio e outras infraestruturas colectivas, numa óptica de sustentabilidade, contribuindo para a adaptação às alterações climáticas, o combate à desertificação e a utilização mais eficiente dos recursos.
A concretização do Programa Nacional de Regadios (PN Regadios) veio disponibilizar recursos financeiros adicionais direccionados para o desenvolvimento de novas áreas regadas. Este programa, ao implementar novos sistemas hidroagrícolas nas zonas mais fragilizadas pelos efeitos das alterações climáticas, constituiu uma importante medida de adaptação e mitigação, incrementando a resiliência e robustez dos sistemas agrícolas, e contribuindo também para a fixação das populações, em particular nas zonas mais afectadas pelo despovoamento.
Fontes de financiamento
O PN Regadios apresenta duas fontes de financiamento distintas: a primeira, que se identifica com as medidas do PDR 2020 de apoio ao regadio, disponibiliza 280 milhões de euros para a reabilitação e modernização de regadios; a segunda vertente, a que recorre aos empréstimos do BEI e do CEB, ao permitir o acesso a mais 280 milhões de euros, veio duplicar o apoio aos regadios colectivos de dimensão economicamente relevante, a concretizar até 2023.
A avaliação do montante do apoio à componente de infra-estruturas colectivas só fica completa se considerarmos também o valor que o PDR 2020 disponibilizou fora do PN Regadios. Com efeito, as componentes de apoio ao emparcelamento rural, à drenagem, à reabilitação de regadios tradicionais de pequena dimensão e às intervenções de incremento da segurança de barragens hidroagrícolas, acrescentam mais 75 milhões de euros aos 560 milhões de euros do PN Regadios. Em suma, o montante dos dinheiros públicos disponibilizados para os aproveitamentos hidroagrícolas colectivos é de 635 milhões de euros no presente período de programação.
Programa Nacional de Investimentos 2030
As intenções do Governo relativamente à continuidade destes apoios consubstanciam-se na proposta de Programa Nacional de Investimentos 2030 (PNI 2030), actualmente em fase de análise pelo recém-criado Conselho Superior de Obras Públicas. Neste documento, propõe-se que a dotação da área temática do Regadio seja fixada em 750 milhões de euros, o que representa um aumento do actual valor do investimento neste subsector para um período temporal semelhante. Tal montante repartir-se-á por dois programas:
- O Programa de Revitalização do Regadio Existente, que aponta para a reabilitação e modernização de infraestruturas hidroagrícolas colectivas, garantindo um funcionamento mais eficiente e sustentável dos regadios, investindo na modernização das infraestruturas de distribuição de água com o objectivo de reduzir as perdas de água e assegurar o desenvolvimento agrícola e agroindustrial sustentado;
- O Programa de Aumento da Área Regada, que persegue objectivos de combate ao despovoamento e aos efeitos das alterações climáticas, contribuindo para a coesão social e territorial através da criação de condições económicas para a fixação da população ao incentivar o desenvolvimento da agricultura e do sector agroalimentar.
- Os estudos que constituíram a base programática dos programas ligados ao Regadio têm identificado consistentemente dois grandes objectivos para o regadio nacional, de resto em perfeito alinhamento com as prioridades relativas à gestão da água, seja em termos nacionais, seja em termos comunitários: por um lado, o aumento da eficiência da utilização da água, tanto no que se refere ao transporte e distribuição, como à aplicação na parcela; por outro, o alargamento da área regada, enquanto medida central de adaptação às alterações climáticas.
Agravamento dos efeitos das alterações climáticas
Estas duas componentes do PNI 2030 – Revitalização do Regadio Existente e Aumento da Área Regada – serão implementadas como programas abertos, isto é, em que os projectos a apoiar serão seleccionados através de um procedimento concursal que avaliará e comparará os méritos de cada candidatura em termos económicos, sociais, ambientais, ponderando ainda as questões do envolvimento e empenho dos beneficiários.
O agravamento dos efeitos das alterações climáticas e a natural limitação dos recursos financeiros disponíveis para o Regadio obrigam a trazer para primeiro plano algumas questões que, embora presentes nos actuais instrumentos de política, terão de ser objecto de tratamento prioritário.
Começando pelos efeitos das alterações climáticas, o sub-sector do Regadio tem certamente que se adaptar à provável redução das afluências dos cursos de água às albufeiras, mesmo que ligeira.
A forma mais racional de o fazer será através do aumento da eficiência de rega e da redução da área regada com as culturas mais consumidoras. As boas práticas neste domínio poderão, em anos de seca, assumir um carácter obrigatório, com a imposição de dotações máximas por cultura. Por parte das associações de beneficiários, a maior frequência de anos de seca obrigará à constituição de provisões financeiras, para fazer face às despesas fixas (com relevo para os compromissos salariais) nos anos com pronunciada redução, ou mesmo anulação, do volume de água cobrado.
O contributo do regadio
Ainda dentro do tema das alterações climáticas, mas agora na sua vertente de mitigação, é importante sublinhar que o regadio poderá dar um importante contributo para os objectivos de descarbonização da economia, nomeadamente através da utilização de energia fotovoltaica para o abastecimento das estações elevatórias que equipam numerosos perímetros de rega sob pressão. Mas há que encontrar um modelo de financiamento repartido, em que uma importante fracção do investimento seja assumida pelos beneficiários.
De outro modo, parte substancial dos recursos financeiros disponibilizados para o Regadio seria desviada para a componente energética, com óbvio prejuízo dos montantes destinados à criação ou à modernização das infraestruturas de regadio propriamente ditas.
Compromisso
O compromisso de adesão por parte dos beneficiários a um novo regadio tem vindo a ser identificado como a pedra de toque do sucesso do respectivo investimento. A necessidade imperiosa de optimizar os investimentos conduzem à conclusão de que a participação dos beneficiários no investimento – mesmo que pequena – tem que integrar o leque dos critérios de selecção das candidaturas. Entendemos que os custos desta alteração de paradigma serão compensados pelo desejado aumento da adesão aos novos regadios e, concomitantemente, pela sustentabilidade económica da própria gestão.”
Pode ler a revista da RRN (Rede Rural Nacional) “emRede n.º9” completa aqui.
Agricultura e Mar Actual