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Calor, incêndios rurais e seca são os riscos climáticos que mais aumentam na Arrábida até 2100

Calor excessivo, incêndios rurais e seca são os riscos climáticos que mais aumentam na região da Arrábida até ao final do século, revela um estudo, que aponta a necessidade de mitigar as causas e adaptar a vida das populações à nova realidade.

Estas são as principais conclusões, apresentadas na quarta-feira num seminário realizado no Convento da Arrábida, do projecto PLACC – Arrábida, um Plano Local de Adaptação às Alterações Climáticas com o objectivo criar estratégias locais de adaptação nos três concelhos do território Arrábida – Setúbal, Palmela e Sesimbra – que permitam reforçar a sua resiliência às alterações climáticas, explica uma nota de imprensa da autarquia de Setúbal.

“Cabe às instituições e às pessoas alterar esse futuro, conhecendo o que são algumas das vulnerabilidades do nosso território, como incêndios, secas extremas e dias de calor muito mais intensos. Este instrumento vai-nos permitir olhar o território de uma maneira mais sustentável e tomar as medidas mais adequadas para que os cenários que foram aqui traçados não se cheguem a concretizar no ano de 2100”, afirmou a vice-presidente da Câmara Municipal de Setúbal, Carla Guerreiro.

A autarca, que no município tem o pelouro do Ambiente, é igualmente presidente da ENA – Agência de Energia e Ambiente da Arrábida, entidade que coordenou o projecto, em cujo consórcio também participaram os três municípios, o Instituto de Geografia e Ordenamento do Território (IGOT) da Universidade de Lisboa e a Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade Nova de Lisboa (FCT NOVA).

Ao destacar o apoio da ENA e das instituições académicas, Carla Guerreiro sublinhou que, com a cenarização feita para todo o território, inicia-se um processo no qual cabe às autarquias tomarem medidas e informarem a população, para “mitigar” os riscos no futuro e “tornar estes problemas mais adaptáveis à vida” no território, embora tenha reconhecido que a capacitação das comunidades locais é um processo moroso e complexo.

Inundações e galgamentos costeiros

Com base na subida do nível do mar, aumento da temperatura, precipitação e vento, foram identificados como perigos climáticos as inundações estuarinas, as inundações e galgamentos costeiros e a erosão costeira e recuo de arribas, o calor excessivo e os incêndios rurais/florestais, as inundações fluviais por cheias rápidas, a erosão hídrica do solo, a instabilidade de vertentes e a seca meteorológica e as tempestades de vento.

O estudo fez projecções até ao ano de 2100 com base em dois cenários, um com uma Representative Concentration Pathway (RCP) de 4.5 e outra de 8.5, a primeira das quais prevê uma concentração de dióxido de carbono atmosférico até 520 partículas por milhão (ppm) em 2070, com um incremento menor até 2100, e a segunda uma situação semelhante à da primeira até 2050, mas atingindo 950 ppm em 2100.

O calor excessivo, os incêndios rurais/florestais e as secas foram considerados os riscos mais preocupantes, embora também se preveja que a frente ribeirinha de Setúbal, as zonas de Praias do Sado, Faralhão, Pontes, Algeruz e Gâmbia e, no concelho de Palmela, o Poceirão e a Marateca fiquem sujeitas ao perigo de inundação estuarina no final do século XXI, por o Estuário do Sado ser afectado pela subida do nível do mar.

Prevê-se que a susceptibilidade ao calor excessivo aumente significativamente até 2100, passando dos actuais dois a cinco dias por ano no sector oeste e cinco a dez dias no sector este para cerca de dez a 20 dias na generalidade do território da Arrábida, com a possibilidade de se poder mesmo atingir 30 a 44 dias, especialmente no sector este, e a particularidade de Sesimbra poder passar de dois a cinco dias por ano para 20 a 30.

Caso se concretize o cenário RCP 8.5, deve aumentar significativamente o perigo de incêndios rurais/florestais, relativamente ao qual actualmente a área com maior risco abrange mais de 108 quilómetros quadrados, nas serras do Formosinho e de São Luís, em Setúbal, nas proximidades do Castelo de Palmela, na Serra do Louro e em Vale de Barris, em Palmela, e nas freguesias de Santiago e do Castelo, em Sesimbra.

Actualmente os três concelhos do território da Arrábida têm uma susceptibilidade moderada às secas, mas o estudo aponta para que haja um agravamento até ao final do século XXI, quando os três municípios, de forma geral, apresentarão uma susceptibilidade muito elevada, excepto nas serras e colinas da Estremadura, incluindo as serras do Formosinho, de São Luís e do Louro, nas quais será elevada, realça a mesma nota.

Calor excessivo

José Luís Zêzere, professor do IGOT e coordenador da equipa que produziu os relatórios do PLAAC – Arrábida, mostrou-se surpreendido com os resultados registados nos itens relativos ao aumento do calor excessivo e aos incêndios rurais/florestais.

“Estávamos à espera de que o aumento do calor excessivo existisse, não estávamos à espera que fosse tão acentuado. O mesmo se verifica relativamente aos incêndios rurais florestais, ou seja, é de esperar que, com mais temperatura, a probabilidade de arder aumentasse, mas os aumentos são suficientemente preocupantes para que a situação não comece já a ser tratada”, alertou.

O académico considerou muito importante “ter consciência” do que está a acontecer e “passar a informação”, pois “o clima vai mudar para mais quente e mais seco, acentuando uma tendência que a população residente já começa a sentir”, uma vez que “mais de metade dos últimos 20 anos já foram de seca e o aumento da temperatura, principalmente no Verão e no Outono, tem sido uma constante”.

Gases com efeito de estufa

Depois de recordar que “praticamente a cada ano bate-se o recorde do ano anterior e assim sucessivamente”, José Luís Zêzere defendeu a necessidade de redução da causa do problema, “que é conhecida e consiste basicamente na emissão excessiva de gases com efeito de estufa, nomeadamente o dióxido de carbono, muito pela queima de combustíveis fósseis, para produção de energia e para os automóveis”.

José Luís Zêzere defendeu a realização de um esforço colectivo “de redução e de substituição do carbono por energias mais limpas”, para “actuar ao nível da causa do problema”, embora tenha avisado que, devido à inércia dos sistemas da atmosfera e do oceano, “mesmo que fosse possível reduzir as emissões de dióxido de carbono de hoje para amanhã, o clima ia continuar a aquecer durante algumas décadas”.

Embora tenha afirmado que “mitigar é fundamental”, notou que isso “não vai ser suficiente”, sendo igualmente necessário “adaptar”, ou seja, ganhar capacidade para “viver num território com um clima mais duro, mais quente, mais seco”, o que implica haver “cidades mais bem desenhadas”, com telhados verdes e ruas arejadas, “onde o ar possa circular de forma que a temperatura não suba tanto”.

PLAAC-Arrábida

O PLAAC-Arrábida representou um investimento superior a 165 mil euros, financiado em 90% pelo Programa Ambiente do EEA Grants, fundo através do qual Noruega, Liechtenstein e Islândia apoiam financeiramente os Estados-membros da União Europeia com maiores desvios da média europeia do PIB per capita, como é o caso de Portugal.

No seu âmbito foram desenvolvidos três planos locais de adaptação climática, que beneficiam um total de 112.331 pessoas, com o envolvimento de técnicos dos três municípios, da comunidade local e dos actores com relevância estratégica para os respectivos fenómenos e para a necessidade de promover os processos de adaptação locais.

Foram feitas três visitas técnicas a zonas de risco climático, realizados dois seminários sobre adaptação local, com mais de 200 participantes, e três sessões informativas com decisores políticos, bem como cinco workshops de capacitação técnica, três reuniões com técnicos e agentes sociais e criadas três redes locais de adaptação, num processo que envolveu 194 agentes, num total de 400 participações.

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