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UE quer proibir munições de chumbo nas áreas húmidas. Caçadores dizem que Regulamento tem “abordagem claramente contrária ao Direito da UE”

A polémica já começou e promete continuar. A Comissão Europeia pretende proibir munições de chumbo nas áreas húmidas, através do Regulamento REACH — Regulamento de Registo, Avaliação, Autorização e Restrição de Substâncias Químicas.

Um Regulamento, originalmente destinado ao sector industrial, que terá votação por escrito e com que a Fencaça — Federação Portuguesa de Caça não concorda, garantindo que a sua “abordagem é claramente contrária ao Direito da UE”, que “é ilegal” e que “não oferece aos caçadores uma compreensão clara e precisa dos seus direitos e obrigações, nem permite que os tribunais nacionais garantam que esses direitos e obrigações serão observados”.

Após a reunião do Comité REACH da União Europeia, a 23 de Junho de 2020, a Comissão Europeia deu indicações para que a Delegação Nacional de cada Estado-membro no Comité REACH exerça o direito de voto, por escrito, da proposta legal da CE sobre a restrição de utilização de chumbo nas zonas húmidas.

Jacinto Amaro: “a definição de zonas húmidas passará a constituir um conceito difuso, com abrangência móvel, dependendo do clima, nomeadamente da ocorrência de precipitação”

“Devido aos graves problemas de ordem prática e legal que a actual proposta da CE coloca, vem a Fencaça por este meio (…) recomendar a rejeição liminar da actual proposta através da votação desfavorável por escrito”, refere um comunicado assinado pelo presidente da Federação, Jacinto Amaro.

Proibição da posse e porte de munições de chumbo

A Comissão Europeia propõe assim restringir a utilização das munições de chumbo no acto venatório (tiro) em (dentro, ou em redor) de zonas húmidas. Na actual redacção da proposta, a CE propõe que “qualquer pessoa encontrada dentro, ou em redor, de zonas húmidas, que utilize munições de chumbo enquanto atirando com arma de caça ou outra, ou que transporte munições de chumbo enquanto se desloca em zona húmida, ou em seu redor”, tenha de demonstrar inequivocamente que “pretenderia atirar noutro local e que se deslocava através da zona húmida, ou área de pântano, para atirar noutro local”.

Para Jacinto Amaro, esta proposta “estabelece uma presunção legal que implica que os caçadores, se questionados por agentes de segurança quando se deslocam para zonas de caça, ou quando regressam de zonas de caça, tenham de demonstrar inequivocamente que o acto venatório será/foi exercido noutros locais que não em áreas húmidas”.

Contudo, acrescenta o presidente da Fencaça, a “presunção de inocência, extremamente importante no Direito da UE e considerada uma expressão do Estado de Direito em todos os Estados-membros, é violada na actual redacção da proposta da CE que implica que a acusação seja incumbida do ónus da prova, tendo que demonstrar os elementos de uma infracção”.

Proposta ilegal

Para Jacinto Amaro, a base da justificação da CE está relacionada com “uma conveniência administrativa para simplificar a aplicação do Regulamento. No entanto, essas considerações/justificações não devem, nem podem, interferir com os princípios fundamentais do Direito da UE, no qual vigora a presunção de inocência e o princípio da prova da inocência, pelo que esta proposta da CE reverte esse princípio e é ilegal”.

Serão muitos os casos em que caçadores, fiscais e agentes da execução da lei, não saberão se estão dentro ou fora do âmbito pretendido da restrição, diz Jacinto Amaro

Definição de zonas húmidas e inclusão de zonas-tampão

Quanto à definição de zonas húmidas e inclusão de zonas-tampão, explica o mesmo comunicado da Fencaça que a CE “propõe usar a definição completa de Ramsar para as zonas húmidas, que expande o âmbito da zona húmida para áreas extensas sem água visível, principalmente porque inclui ‘áreas de turfa’, incluindo todas as áreas de turfa, ou turfeiras, sem água visível”.

O comunicado assinado por Jacinto Amaro realça que essa definição “é altamente ambígua para os caçadores e para as entidades fiscalizadoras na decisão do que são áreas turfeiras (que incluem muitas florestas), e nas quais a turfa e a água ocorrem ao nível superior do solo. Uma complexidade adicional é acrescentada pelo esclarecimento da CE de que uma área temporária de 1 m² de água, que surge, por exemplo, num campo seco depois de precipitação intensa, constitui uma ‘zona húmida’ sob esta definição”.

E reforça que “este aspecto, combinado com zonas-tampão de 100 metros, criará uma confusão generalizada e significa que a definição de zonas húmidas passará a constituir um conceito difuso, com abrangência móvel, dependendo do clima, nomeadamente da ocorrência de precipitação. Estas noções são simplesmente absurdas, sem qualquer noção prática ou adesão à realidade, e farão com que os Estados-membros invistam enormes recursos no treino de agentes de fiscalização e de caçadores tendo em vista o mapeamento e orientação sobre o que constitui um pântano ou uma zona húmida”.

Aplicabilidade do REACH aos caçadores

Quanto à aplicabilidade do REACH aos caçadores, Jacinto Amaro diz que “não é claro se o regulamento REACH, originalmente destinado ao sector industrial, poderá ser legalmente aplicável aos caçadores (como ‘consumidores’). O REACH nunca foi aplicado anteriormente neste contexto e, portanto, a ser aprovada esta proposta, o âmbito deste Regulamento expandir-se-á muito além das suas atribuições e âmbito originais”.

Agricultura e Mar Actual

 
       
   
 

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