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Baixo Alentejo com 94% de susceptibilidade à desertificação. REA Alentejo promove reabilitação de ecossistemas

Cerca de 94% da NUTS (Nomenclatura das Unidades Territoriais para Fins Estatísticos) Baixo Alentejo é susceptível à desertificação. A informação divulgada hoje, 17 de Março, pelo REA Alentejo, um projecto promovido pela ADPM — Associação de Defesa do Património de Mértola, dá conta de que a NUTS Baixo Alentejo, que compreende 13 concelhos — entre os quais Beja, Mértola e Serpa —, apresenta 38% do seu território com susceptibilidade crítica à desertificação, 35% muito elevada e 21% elevada (e apenas 5% moderada e 1% reduzida). Já na margem esquerda do Guadiana, os valores sobem quase aos 100%, com 96% da área susceptível à desertificação (32% crítica, 37% muito elevada e 27% elevada).

Apresentado esta sexta-feira em Beja, o projecto tem como principal objectivo criar um modelo replicável que permita restaurar a produtividade agrícola e florestal nas zonas semiáridas do sudeste de Portugal, que potencie uma melhoria da saúde do solo, do funcionamento dos ecossistemas e, consequentemente, da qualidade de vida das comunidades rurais. Promovido pela Associação de Defesa do Património de Mértola, o REA Alentejo conta ainda com a parceria de várias organizações académicas e governamentais, como a Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa (FCUL), a Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa (Nova FCSH), a Junta de Freguesia da Cabeça Gorda (JFCG) e a Câmara Municipal de Barrancos (CMB), em colaboração com o DRAAL — Centro de Experimentação do Baixo Alentejo.

Elevado grau de degradação dos solos

“Temos vindo a assistir, nos últimos anos, a um elevado grau de degradação dos solos nesta região, como consequência da desertificação. Este projecto pretende incrementar, em larga escala, aquilo que tem vindo a ser o trabalho da ADPM no combate à desertificação e restauro dos habitats de montado. Acredito que o REA Alentejo será de grande importância para a região, quer pela dimensão da actuação, quer por se tratar de um projecto a implementar em áreas públicas e privadas”, explica María Bastidas, coordenadora do REA Alentejo.

O REA Alentejo terá quatro áreas de intervenção: o Centro de Estudos e Sensibilização Ambiental do Monte do Vento e a Herdade de Vale Formoso — ambos inserido no Parque Natural do Vale do Guadiana — e o Parque Biológico da Cabeça Gorda e o Perímetro Florestal de Barrancos — áreas de elevado Risco de Erosão Hídrica, inseridas na Reserva Ecológica Nacional.

Em 80 anos, valor médio de precipitação caiu para metade

Entre 1940 e 2022, os dados recolhidos pela Estação Meteorológica de Vale Formoso permitiram traçar um cenário de diminuição acentuada na média de precipitação anual, por décadas. Se na década de 40 o valor médio anual de precipitação era de quase 800 (755,4 mm), na década de 2010 o valor diminuiu para 474,2 mm. Em particular em Mértola, é clara a diminuição da precipitação registada. De 1940 a 1970, a média anual de precipitação foi de 601 mm, enquanto que nos últimos 30 anos (de 1991 a 2021) o valor desce para os 446 mm, refere uma nota de imprensa do REA Alentejo.

“A perda de produtividade dos solos é um problema sério em Portugal e, em particular, nesta região. Mas o fenómeno da desertificação tem diversos factores e um deles é, sem dúvida nenhuma, a questão climática. A aridez tem aumentado, em consequência das temperaturas mais elevadas e devido a um declínio acentuado na precipitação nas últimas décadas, o que contribui para uma alteração na estrutura dos solos e nas quantidade e qualidade dos recursos hídricos”, esclarece Maria José Roxo, investigadora da Nova FCSH e responsável pelo CEEVF.

“No entanto, o uso do solo, através da agricultura intensiva, é também um importante factor a ter em conta nesta matéria, uma vez que esta prática não tem em vista a protecção do mesmo e este vai perdendo qualidade”, acrescenta ainda a investigadora.

O projecto agora anunciado, terá um papel importante no combate a estes problemas porque vai permitir pôr em prática uma série de técnicas de reabilitação de ecossistemas num contexto de alterações climáticas — como a diversificação do Montado através da plantação de bosquetes, recuperação de linhas de água, melhoramento de pastagem com mobilização mínima e gestão do pastoreio.

Aumento dos fenómenos extremos

As mudanças climáticas no Baixo Alentejo são também já uma evidência. A investigação levada a cabo pela equipa da Nova FCSH no CEEVF, traz novas conclusões de episódios recentes relacionados com fenómenos extremos.

Se, por um lado, o último ano climático (de Setembro de 2021 a Agosto de 2022) não trouxe a seca mais severa de que há registo — apresentando o valor total anual de precipitação na ordem dos 398mm (ainda assim abaixo da média de 509mm, para o período de 1941/42-2021/22) —, por outro lado, só no período de Inverno (de Dezembro de 2022 a Fevereiro de 2023) choveram mais 200mm.

“Esta enorme irregularidade na precipitação e na distribuição pelas estações do ano, contribui para uma grande incerteza em termos agrícolas e para o desencadear de episódios de erosão que favorecem a degradação dos solos, quando ocorrem chuvas intensas ”, esclarece Maria José Roxo.

“Este novo projecto coloca o foco maior na preservação e protecção dos solos. Vamos implementar uma série de medidas que passam, por exemplo, pela conversão de eucaliptais em fim de produção em sistemas silvoagropastoris, ou outras medidas, em ambiente agrícola, que promovam uma melhor gestão, que limite a erosão”, conclui María Bastidas, coordenadora do REA Alentejo.

Até ao final do ano, o projecto prevê, entre outras coisas, beneficiar 81,1 hectares com acções de restauro de ecossistemas mediterrânicos, nos 3 concelhos de actuação.

A apresentação do projecto, contou ainda com a demonstração de boas práticas que estão a ser implementadas pelos agricultores no Parque Natural do Vale do Guadiana, através do “Programa Territorial +Solo +Vida”, co-financiado pelo programa EEA Grants, e com a divulgação de estratégias de adaptações às alterações climáticas, através do projecto “Life Desert-Adapt”, financiado pelo programa LIFE da União Europeia.

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